30/07/2015

A Misericórdia Divina

A Misericórdia é o modo de Deus amar o Homem, ferido pelo pecado e habitado pelo sofrimento. É a maneira que Deus tem de manifestar, à humanidade, o Seu infinito amor por ela.

A palavra Misericórdia provém do latim e é composta por misere, miséria, em português, e por cordie, que quer dizer coração. Sendo assim, a misericórdia é o coração mesmo de Deus que se debruça sobre a miséria humana a fim de visitá-la e de transformá-la, por meio do Seu amor. Deus, em Seu infinito amor misericordioso não quer, tão somente, apagar todo sofrimento, pecado ou miséria do ser humano, Ele quer muito mais que isso. Para que possamos compreender melhor, tomemos um exemplo concreto a partir da narrativa de Lc 24, 13-35: os dois discípulos de Emaús.
Os discípulos estavam indo embora de Jerusalém, porque tudo parecia haver acabado com a morte de Jesus, parecia que toda a esperança que eles tinham era pura ilusão e que, finalmente, não havia outra conclusão a chegar senão, a de que Jesus não era o Messias. Eles estavam profundamente tristes e, por isso, decidiram sair de Jerusalém, perdendo assim, toda esperança. Eles estavam vivenciando a experiência da “desilusão” e o profundo sofrimento que ela traz consigo. Por causa desse sentimento, a visão que eles tinham da realidade estava obscurecida e, sendo assim, eles não conseguiam transcender os últimos acontecimentos e perceber o que estava realmente acontecendo.
É neste cenário que Jesus aparece, aproxima-se e caminha com eles. Jesus se põe a caminhar com eles: eis aqui o elemento chave para entendermos o modo de Deus agir por meio da Misericórdia. Jesus caminha com eles, exatamente nesse percurso que eles escolheram, ou seja, o de retornar a Emaús. Jesus sabe muito bem, que esse caminho não os conduzirá à verdade, tampouco o que eles pensam é o que realmente está acontecendo, mas Ele não diz nada, simplesmente se faz presente na vida deles de uma maneira que eles nem percebem. Contudo, eles não o reconhecem, não pelo fato de que Jesus não queira manifestar-se, mas, tão somente, porque o sofrimento vivenciado pelos discípulos impede-lhes de perceber a real presença de Jesus, posto que,naquele momento é a tristeza, fruto da decepção, que tem lugar dentro deles, não abrindo o espaço necessário e fundamental para que Jesus possa mostrar-lhe um horizonte distinto, que os ultrapasse, algo que eles já sabiam, porém que, naquele instante, eles não conseguiam mais acreditar (Lc 24,22-24).
Assim, acontece também em nossa vida, em relação aos nossos sofrimentos: quando eles vêm, chegam, a turvar-nos a visão, por um momento, de modo que não mais saibamos como sair daquela teia, e, por isso, sentimo-nos fracassados, derrotados, sem esperança, frágeis, débeis, sem força, quase como se habitássemos o fundo do poço. Somente por essa causa, tomamos o caminho da tristeza. Por ora, pensemos naquilo, dentro da nossa vida, que não temos a menor esperança de mudança, e que, mesmo Jesus parece não poder fazer coisa alguma. Mesmo porque, sobretudo, parece que Jesus não pode nada. Todavia, é nesse lugar existencial, nesse exato instante que Jesus quer se fazer presente, por meio de Sua Misericórdia.
Deus jamais virá, em Sua Misericórdia, para revelar-nos que estamos no “caminho errado” sem ter realizado conosco o percurso que tomamos, sem ter estado ao nosso lado, ajudando-nos,pouco a pouco, a vivermos conhecendo a verdade e enxergando-a realidade como ela realmente é.

Neste sentido, a Misericórdia em nossa vida, faz-se presente, por meio da simplicidade e da pequenez, no modo como que Deus se faz pequenino, pondo-se no mesmo nível que o nosso, para paulatinamente ir transformando-nos e abrindo-nos para a verdade, para a vida, descentralizando-nos e abrindo-nos plenamente para Si e para o Seu amor. Ele, então, lhes disse: Ó gente sem inteligência! Como sois tardos de coração para crerdes em tudo o que anunciaram os profetas”! (Lc 24,25)
Então, Jesus fala: agora sim é o momento certo para Jesus falar, porque os discípulos tiveram tempo para “desabafar”, para narrarem eles mesmos a história e o que eles pensavam a respeito de tudo aquilo que haviam acontecido. Após aguardar o tempo que precisavam Jesus lhes fala o que era necessário dizer. Na verdade, existe um momento certo para reconhecermos a manifestação da Misericórdia. Ela não pode ocorrer a qualquer momento, existe um momento propício, e cada um de nós tem o seu tempo e Deus respeita imensamente esse tempo, porque a Misericórdia só será acolhida se for vivenciada no momento exato, e esse momento acontece quando conseguimos nos abrir a Deus e o deixamos manifestar-se plenamente em nós.
A Misericórdia de Deus respeita o nosso tempo; ela não nos invade, nem nos obriga a absolutamente nada. Simplesmente Ela vem, permanece ao nosso lado, torna-se presente e espera o momento oportuno para manifestar-se de maneira concreta.
Desta feita, Jesus pôde explicar aos discípulos, o que realmente estava acontecendo e lhes ajudar a enxergar a realidade com os olhos de Deus, já que seus olhos, naquele momento, estavam abertos para recebê-la. Naquele momento, os discípulos de Emaús retornaram a Jerusalém, sentiram-se fortalecidos no seu mais profundo âmago e, renovados interiormente, puderam crer nas promessas de Jesus. Do mesmo modo, age a Misericórdia em nossa vida: Ela vem, aproxima-se, caminha conosco, fortalece-nos e renova-nos.
Deixemos que a Misericórdia possa nos visitar.
Irmã Maribel Pérez León